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Revista / Capa

Carlinhos de Jesus sobrevive à Covid-19

Após internação na UTI, o dançarino revela que teve medo da morte

Bianca Portugal Publicado em 15/05/2020, às 16h41 - Atualizado às 17h02

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Em sua cobertura, no Rio, o coreógrafo segue a recomendação médica de tomar sol todos os dias para a recuperação após o novo coronavírus - Acervo Pessoal
Em sua cobertura, no Rio, o coreógrafo segue a recomendação médica de tomar sol todos os dias para a recuperação após o novo coronavírus - Acervo Pessoal

Um dos maiores nomes da dança no Brasil, o coreógrafo e dançarino Carlinhos de Jesus (67) agora é também um sobrevivente. No dia 17 de abril, ele começou a sentir as principais características do novo coronavírus: febre, mal-estar, muito cansaço, inapetência total a ponto de sentir dificuldade até para tomar água e perda do olfato e paladar. Tratado pela cunhada, que é infectologista, em cinco dias ele melhorou e zerou os sintomas. A surpresa foi quando tudo voltou e ele já não conseguia nem
ficar de pé. “Não é uma doença qualquer. É avassaladora. Tive uma sensação muito ruim que ia morrer”, resumiu ele, que ficou na UTI. Ainda em recuperação e já em casa ao lado da mulher, Rachel Vieira (67), que também teve a doença, mas de forma mais branda, o coreógrafo contou sua experiência com a Covid-19, que já matou milhares de pessoas no País.

– Você tem alguma suspeita de como pegou o vírus?

– Provavelmente em uma ida ao supermercado. Estávamos de máscara e fomos em horário de pouquíssimo movimento, indicado para a terceira idade, às 6h30. Depois, as compras foram só por delivery. Em casa, não recebíamos nem a filha e o genro. Acho que nos contaminamos aí. Lembro-me de que na gôndola de chocolates escolhia, desistia, voltava a pegar, mexia na máscara, que ainda era novidade e não usava direito.

– Quando foi ao hospital a primeira vez, já foi internado?

– Na verdade, como tínhamos tomado a vacina da influenza e a pneumococo 23, portanto, estávamos protegidos da gripe anual. Quando começaram os sintomas, minha cunhada fez um protocolo sugerido pelos estudos epidemiológicos. Em cinco dias, estávamos sem sintomas. Mas, dois dias depois, a febre voltou muito alta, cansaço, prostração, inapetência, oxigenação muito baixa, não conseguíamos ficar de pé. Não tínhamos falta de ar, só mesmo um cansaço surreal. Fomos então ao Hospital Copa D’Or e a tomografia apresentava pneumonia viral, imagem de vidro fosco, característica da Covid-19, tomando 50% dos meus pulmões e 25% dos da minha mulher. Aí eu fui direto pra UTI. Esse momento foi muito difícil...

– Quantos dias ficou internado? Precisou de respirador?

– Fiquei internado quatro dias. Primeiro, na UTI. Não precisei de respirador, fiquei em monitoramento rigoroso, cateter de oxigênio e medicação endovenosa por três dias. No quarto dia, me transferiram para a Unidade SemiIntensiva e, no dia seguinte, alta.

– Achou que poderia não se recuperar desta doença?

– Sim, principalmente no momento da internação. O médico carinhosamente permitiu que minha mulher se despedisse de mim porque o caso dela poderia ser tratado em casa, e fiquei com uma sensação muito ruim, de que poderia morrer... Ao dar entrada na UTI, continuava apreensivo, mas o atendimento foi muito caloroso, atencioso e, principalmente, esclarecedor, pois me diziam tudo, passo a passo. Isso me trouxe muita tranquilidade.

– Você é um homem de muita fé! As orações são fundamentais também no tratamento?

– Sim! Rezei muito, principalmente as orações de São Jorge e de São Francisco de Assis. Sabia que tinha muita gente enviando mensagens de carinho e orações pela minha cura, isto tudo me motivou a pensar positivamente.

– Algumas pessoas têm sofrido preconceito dos vizinhos na volta para casa. Tem passado por isso?

– Ao contrário, recebi muitas manifestações de carinho, amizade e de pronta recuperação.

– Em casa é só você e Rachel? Conseguem cuidar de tudo?

– Temos um secretário, José Roberto, que mora conosco, nosso anjo da guarda! Minha filha, Tainah, é nossa vizinha e faz os pedidos de farmácia, supermercado... Somos muito privilegiados. Em casa, José Roberto, que graças a Deus não se contaminou, fica no 1º andar e temos todo o cuidado de não nos cruzarmos; uso de máscara é fundamental na minha residência.

– O tratamento continua?

– Sim! Continuo com anticoagulante por mais 30 dias e fisioterapia pulmonar

– Já consegue fazer alguma atividade física ou ainda não?

– Conseguir, sim, mas não estou liberado. Tive alta com 25% do pulmão ainda afetado e só terei alta definitiva no final de maio.

– E a vida financeira, com a escola de dança fechada?

– Tenho duas unidades da Escola Carlinhos de Jesus, no Rio e em SP, sem funcionamento. Vários trabalhos artísticos foram cancelados. A curto prazo, tenho muito receio de como manter minhas responsabilidades. Mas sou otimista, acredito que acharemos uma forma de driblar as dificuldades e acertar o jogo da vida...

– O que recomenda a todos?

– É um verdadeiro engano achar que é uma gripezinha, só quem passa pela doença sabe... Pode até ser mais branda para alguns, mas mata também, quem vai pagar pra ver? Na UTI onde fiquei, rede particular, eram nove baias. Todas ocupadas! O que tenho a dizer é: só saiam de casa numa real necessidade.

– Acha que muita coisa vai mudar daqui pra frente ou não?

– Esta pandemia nos deu a certeza de que não temos o domínio de nada. Mas nos trouxe de volta a solidariedade e a nossa vulnerabilidade. Acredito que muita coisa mudará no mundo pós-pandemia, e uma delas, a mais importante, é a melhora do SUS, da medicina, da saúde global. Saúde é fundamental e não tem política que possa interferir.